Aquela deveria ser mais uma tarde monótona de sábado na vida da senhora Mick. Mas não. No final daquele dia, ela teria um encontro que ansiava há tempos. Ansiava, mas não admitia. Iria novamente para a Maçonaria. Entre os diferentes clubes de amizade e cívicos que frequentava, este era seu preferido. Lembrava-se da última vez que havia ido para lá, das conversas filosóficas que tivera com seus amigos maçons, depois de suas reuniões como Estrela do Oriente, e de como todos ali transmitiam uma sensação serena. Somado ao seu simbolismo, a Loja a fazia ter a certeza de que lugar mais virtuoso que aquele só a casa do seu Grandioso Arquiteto do Universo. A lembrança de suas experiências vividas lá fazia lágrimas quererem brotar dos seus olhos. Há quanto tempo não sentia aquilo? Havia se afastado. Estava distante e não entendia o porquê. Ou talvez soubesse, e o negava para si.
Balançou a cabeça rapidamente, como se a agitação afastasse aqueles pensamentos e fizesse o nó na sua garganta desatar. Saiu de frente da janela em que estava e foi sentar-se à mesa, onde se dedicava a suas pinturas. Aquelas porcelanas decoradas eram seu hobby favorito. Atou uma fita aos cabelos, para que estes não a incomodassem, pôs um avental para proteger o vestido da tinta óleo, respirou fundo e foi ao encontro da distração.
Quando deu por si, espantou-se com o tempo que havia passado. Já eram três da tarde e, quase involuntariamente, levantou-se, pensando angustiada “Restam-me apenas 4 horas para a reuni...” e parou. Derramou-se novamente na cadeira. “Por que?”, disse, com o rosto pesado sob as mãos e os cotovelos apoiados na mesa. “Por que uma coisa tão boa e pura maltrata tanto o meu coração?”. Deixou os braços caírem ao lado do corpo, para que seus olhos pudessem chorar livres.
Uma de suas mãos alcançou uma gaveta, a última delas. Ethel sentiu uma sensação estranha ao tocar naquela gaveta novamente. “Por que?”, perguntou-se, mas desta vez com curiosidade na voz, ao invés de súplica. Abaixou-se e a abriu. Não conteve os soluços que vieram, pois acabara de encontrar a solução que acalmaria seu coração de um tormento vivido há tempos. Na gaveta, estava lá um velho e quebrado porta-retrato. Com as mãos trêmulas, ela o pegou, soprando a poeira. Olhando para a foto, percebeu que havia se esquecido do quanto seus olhos lembravam os de sua mãe naquela fotografia. Havia se esquecido dos seus vestidos pesados, da lavanda suave que era o seu perfume e do seu sorriso... Ah, aquele sorriso...
Retirou o retrato daquela moldura aos pedaços e o virou. No verso, encontrou a luz que iluminaria suas memórias passadas e a sua vida dali em diante, resumida em uma única frase. Com a caligrafia da sua mãe, estava escrito “Em toda a Terra não se encontraram mulheres mais justas que as filhas de Jó.” E, à tona, as lembranças dançaram a sua volta, as de quando ela, ainda criança, adorava ouvir os ensinamentos que o Livro Sagrado guardava em suas páginas, em especial os do Livro de Jó, onde, apesar da pouca idade, o fez compreender que, mesmo diante das dificuldades da vida, não se deve desistir de Deus, pois Ele é o único que poderá te guiar para o caminho dos teus sonhos. “Sonhos...”.
A última lembrança fez Ethel abraçar a foto, como se a ninasse. Lembrou-se de uma promessa que fizera a sua mãe, que, um dia, iria fazer com que jovens meninas que acreditassem em Deus, se unissem em torno de um ideal: seguir os ensinamentos de Jó. Aquilo fizera sua mãe escancarar o sorriso mais lindo e orgulhoso que ela já havia visto em seu rosto, tão suave quanto porcelana.
A porta da casa se abriu, e a senhora Mick, ainda com o retrato em seu colo, viu suas duas filhas, Ethel e Ruth, rindo, desfrutando da doçura da infância. As duas, ao perceberem as lágrimas no rosto da mãe, foram até ela, preocupadas e perguntando se ela teria se machucado. Envolvendo as suas meninas nos braços, Ethel fechou os olhos e, tendo a certeza de que era esse sentimento que ela queria que o mundo sentisse, disse, decidida: “Meus Brotos de Promessa, este é só o início de uma felicidade sem fim que eu sentirei, juntamente com vocês, com minha amada mãe e com nosso Grande Pai Celestial.”.
E, com suas duas filhas nos braços, sua mãe no coração e a força de vontade nos olhos, levantou-se e foi escrever uma das mais grandiosas lições de amor que o mundo um dia veria.
Maria Olívia Jardelino, Bethel 08 Campina Grande, PB. Texto que tirou 1º Lugar no Concurso Cultural do BlogFDJBRASIL.
Espetáculo de texto!
ResponderExcluirParabéns!
ResponderExcluirTem alma de escritora! Leria um livro inteiro assim! =)
Sua linda! Me fez chorar! Que texto maravilhoso!! Muito orgulho de você,Mo!
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