O DESAFIO DE SER UMA FILHA DE JÓ MODERNA

Carregar o título de “a mais justa da Terra” não é uma tarefa nada fácil, ainda mais quando se é adolescente. Quando estamos dentro do Bethel, com nossas irmãs e guardiões, parece ser mais “natural” cumprir com nossos deveres. E quando saímos de lá? Você já deve ter ouvido a expressão: “Ser uma Filha de Jó dentro e fora do Bethel.” Mas o que isso significa?
É bem mais fácil seguir as regras ou andar na mesma linha das pessoas com as quais convivemos. Estamos mais dispostas a praticar o bem, o amor e os mais altos ideais de vida quando as circunstâncias estão favoráveis. Mas, fora do Bethel, ou melhor, no nosso dia – a – dia, estamos cada vez mais expostas a influências negativas e aos mais variados tipos de agressão verbal, visual e até mesmo física.

Acredito que hoje seja mais difícil ser uma Filha de Jó fora do Bethel do que anos atrás. Como disse, é bem mais fácil “andarmos na linha” quando as pessoas em nossa volta também estão seguindo. Você já deve ter ouvido dos seus pais ou de seus avós o quanto “a juventude está perdida” ou o quanto “no meu tempo não era assim”. E, de fato, muita coisa não é mais como era antigamente.

Quando eu era adolescente, o acesso à internet estava começando. Celulares e computadores em casa eram raros. Era muito difícil conhecermos alguém que já tivesse visto – e muito menos – experimentado drogas. E, ainda assim, não era muito fácil ser uma Filha de Jó.

Até porque, todo, todo adolescente no mundo, independente da época, passa pelas dúvidas e transformações inerentes à idade. A mudança física e suas explosões hormonais, o despertar do interesse sexual, as dúvidas quanto ao que estudar... E, claro, a necessidade de fazer parte de um grupo e, ao mesmo tempo, buscar sua identidade.

Então, você vê amigos, colegas de classe ou conhecidos, fumando, bebendo, saindo com várias pessoas diferentes... Virando a noite em baladas ou barzinhos. Pintando o cabelo, se tatuando ou colocando piercings. E você não pode dizer que eles são simplesmente “más pessoas”, porque dentro do seu coração você sabe que não é bem assim. E chega a reunião do Bethel, você e suas irmãs estão de veste branca, dentro daquele templo sagrado que parece o céu e vem a pergunta: “Onde se encaixa tudo isso?” Você se sente em um universo paralelo, um mundo à parte, só seu e de mais ninguém. Os ensinamentos do ritual e todas aquelas palavras doces e profundas tocam o seu ser, mas não respondem as suas perguntas. Você aprendeu que o mundo está muito errado, mas agora o mundo lhe parece um mar de possibilidades. E, você confessa, não parece ser um mar de possibilidades tão ruins assim já que as pessoas parecem estar se divertindo tanto! E, talvez, por pensar assim, você não seja realmente uma Filha de Jó como pensava ser...

Infelizmente, é nesse momento que muitas Filhas se afastam do Bethel. Porque o mundo fora do Bethel nos pressiona e parece nos engolir como uma sedutora onda do mar. E sentimos uma necessidade imensa de explorarmos essas possibilidades, mesmo que isso signifique seguir um extremo oposto ao que nos foi ensinado.

Ser uma Filha de Jó não é um “selo Inmetro de qualidade”. Não significa que a jovem é um ser puro e intocável, que não irá falhar ou errar e que não possua “dúvidas e desejos mundanos”. Que não sinta vontade de experimentar cerveja ou esticar um pouquinho do horário, mesmo que seus pais tenham dito para voltar cedo. Que não fique em dúvida se é o momento ou não de “dar um passo a mais” com o seu namorado, já que é uma das poucas de sua turma a ser virgem. Mas aí vem a lembrança da veste branca, “que a beleza brilha da pureza”, que é preciso ter paciência para chegar a hora certa das coisas e.... aaaaah! Que vontade de soltar um berro e sair correndo!!!

Calma, irmãzinha. Sem desespero! Ser uma Filha de Jó significa que, se um dia você se esquecer de quem você é, você poderá buscar a sua essência em seu Bethel, com suas irmãs e guardiões.

Porque a única herança que não pode ser perdida é o conhecimento. O que nos foi ensinado nunca poderá ser tirado de nós. E é por isso que uma Filha de Jó sempre será um lindo lírio em meio a um vasto campo. Mesmo que esse lírio fique, de vez em quando, meio murchinho e precisando de um adubo ou um pouquinho de água. Mesmo que tropecemos, erremos ou falharmos, uma voz ecoará baixinho em nossa alma e nos dirá exatamente o que fazer.

Na maioria das vezes, para todas as opções que se colocam a nossa frente, basta nos fazermos a pergunta: “Me convém?”. Me é permitido fazer isso, mas... trará o meu bem? 

Ser Filha de Jó depois da maioridade foi ainda mais difícil para mim. Fui morar em outro estado, não tinha mais minhas irmãs tão perto de mim. Muitas vezes me perguntava o que elas me diriam se pudessem estar ali e assim eu ia guiando meus passos. Das vezes em que dei passos em falso, bastaria ter recorrido às palavras inspiradoras do livro de Jó. Ou simplesmente trocado um e-mail ou feito um telefonema para alguma irmã. Isso teria me evitado umas belas escorregadas – e tombos! 

Ainda hoje, quando me deparo com alguma situação difícil no trabalho ou nos meus relacionamentos, me pego lembrando das palavras escutadas no Bethel. Digo a mim mesma o quanto é preciso ter paciência, o quanto nenhum mal perdura para sempre e o quanto preciso ser grata em meus momentos de prosperidade. O quanto é preciso saber reconhecer o mal disfarçado de bem e as palavras vãs de palavras sinceras. E daí chego a conclusão que, por mais difícil que possa parecer ser uma Filha de Jó moderna, o nosso coração é muito sábio e basta recorrermos a ele para nos levar de volta pra casa nos dias em que nos perdermos pelo caminho. E os tempos modernos não trazem só dificuldade. Em tempos de Facebook e whatzapp, nossas irmãs podem estar bem pertinho da gente, a distância de um clique, prontas para nos dar aquela força!

Semiramis Dominghetti